As sombras do ‘nuno’, os bustos azuis e as fragrâncias do açafrão
01 > 30 OUTUBRO I MUSEU ARQUEOLÓGICO DO CARMO
Inaugura a 1 de outubro, no Museu Arqueológico do Carmo, a exposição individual de José Quaresma com o título: As sombras do ‘nuno’, os bustos azuis e as fragrâncias do açafrão que pode ser visitada entre 1 e 30 de outubro, tanto física como virtualmente.
Dois dias antes da inauguração será disponibilizado na plataforma da FBAUL um catálogo digital com imagens de todas as obras expostas. Cinco dias após a inauguração “física” será disponibilizado, também nesta plataforma, o registo videográfico para a visita virtual.
Esta exposição consiste na criação de diversas evocações — algumas indiciais e tendencialmente abstractas, outras parcialmente figurativas — resultantes do entrelaçamento entre a expressão da pintura (bidimensional e tridimensional) e determinadas peças arqueológicas do Museu Arqueológico do Carmo (MAC), intactas ou fragmentadas, tais como bustos, túmulos, colunas, outras. Inclui ainda duas obras que aludem a um tempo mais remoto e característico da eclosão do próprio acto de pintar, como a reconfiguração plástica de objectos naturais (conchas spondylus) com pigmentos usados há cerca de 60.000 anos pelo homem de Neandertal, segundo investigações conduzidas por João Zilhão e outros especialistas dos vestígios da simbolização humana.
Sendo assim, a intenção consistiu no desenvolvimento de um diálogo vivo e interpelante entre a pintura, a instalação pictural, o poder evocativo de certos “objectos” que o MAC conserva, e a relação imemorial entre o “pintar de hoje” e o “pintar mais remoto” que já se investigou no espaço europeu até ao presente, seja a “escada” pintada de La Pasiega, a “mão” stencilizada de Maltravieso, ou as misteriosas “conchas” da Cueva de los Aviones, Cartagena.
Mais concretamente a exposição compõe-se de treze pinturas e de três instalações de pintura no espaço interior do Museu Arqueológico do Carmo, e da inserção de uma pintura tridimensional numa das naves laterais da igreja, a parte descoberta do MAC. A produção destas obras orientou-se segundo três sugestões nucleares. (1) Potencial matérico, ou seja, a exploração da materialidade intrínseca à própria elaboração de uma pintura, em confronto e assimilação das matérias (algumas já transformadas devido ao processo de erosão) usadas nos elementos arqueológicos que caracterizam a atmosfera específica do MAC. (2) Potencial pictural com origens dispersas pela nossa vida mais remota, nomeadamente do homem de Neandertal, fruto da exploração de diversas grutas na Península Ibérica por especialistas em Arqueologia e Paleo-antropologia, elaborando a estratigrafia e remexendo em sedimentos, aspirando a tocar a “rocha mãe”. (3) Potencial afectivo, desta vez entre os humanos e os animais em ambiente arqueológico e cultural, pois, nada mais tocante, disruptivo, mas ao mesmo tempo natural, do que imaginar um “Mago” como o de Miguel Torga, entrever um “Nuno” ou dar com uma “Carlota” miando e “arqueando o lombo” sob a pureza espacial das ogivas do MAC.
Lisboa, 15 de setembro, 2020
José Quaresma