corpo de meteorito
02 > 28 MAIO I CAPELA BELAS-ARTES
Corpo de Meteorito, exposição de Mikha-ez, patente na Capela das Belas-Artes entre 2 e 28 de maio de 2018. Esta exposição, com curadoria de João Castro Silva, insere-se na programação oficial da 12º edição das GAB-A, Galerias Abertas das Belas-Artes e, por isso, a sua inauguração realiza-se no dia 19 de maio, às 14h00, com a presença do artista.
No dia 16 de maio realiza-se uma coreografia coordenada de Mikha-ez e Laura Índigo, às 12h00 e outra às 17h00,
Horário: as visitas deverão ser agendadas com o artista através do e-mail mikhaez@usal.es
Este evento é passível de ser registado e divulgado pela Faculdade através de fotografia e vídeo
RELAÇÃO
Todo o conhecimento é uma relação, um processo permanente e contínuo do nosso corpo com o cosmos; trocas, sinais, informações, sensações. O que existe para nós, é dependente da nossa compreensão. Para lá da nossa medida, aquilo que não é, ou foi alguma vez, parte do nosso corpo, não poderá nunca persistir. As bases relacionais que mantemos com aquilo que criamos, observamos, vivenciamos são tão essenciais que as suas articulações são as mesmas da nossa existência[1]. Trata-se de relações que são feitas por mediação, digamos, quer pelas impressões que nele inscreveu o gesto criador, quer pelas que o olhar fruidor recria.
O espaço não se limita a um conceito físico pois só através de um processo de abstracção mental poderemos estabelecer os códigos da sua percepção. A noção de espaço é inerente à própria existência humana e dela deriva[2]. A percepção de um objecto, de uma forma ou de uma grandeza, como reais, reenvia-nos a um mundo de sistemas de experiências em que o nosso corpo e os fenómenos estão inseparavelmente interligados.
Espaço é a extensão do ‘meu’ corpo, projectada em todas as direcções até ao infinito; as posições intencionais e os movimentos projectados no espaço impõem-se pelo seu efeito desde a aparição do homem[3]. Espaço é a relação que os corpos, objectos, ou coisas, mantêm entre si; corpos que se relacionam com outros, sendo embora uns, entidades vivas e os outros, entidades inertes. Relação, ainda, do corpo com os elementos que o constituem porque todas estas ‘variáveis’ se integram intrinsecamente.
Na percepção, o interior revela-se no exterior, numa significação que só se pode compreender plenamente através do tacto e do olhar. “A palavra percepção vem de percipio que se origina em capio - agarrar, prender, tomar com ou nas mãos, empreender, receber, suportar. Enraíza-se, portanto, no tato, (…).”[4] O olho que percepciona, utiliza informação anteriormente apreendida e reconhece, interpreta, antecipa e prevê o que surge no seu campo de visão. O nosso sistema visual reage a estímulos externos, mas não é esse estímulo que vai determinar a percepção. Existe um vão entre os estímulos externos a que o nosso olho reage e a percepção, e é nesse vão que o olhar se torna criativo, inteligente. Perceber é assimilar os estímulos e dar-lhes um significado, adivinhamos o que vemos, completamos com as nossas memórias aquilo que se oferece aos nossos sentidos. Uns vêem como fundo aquilo que outros entendem como figura, o significado é obra nossa, individual. Vemos aquilo que sabemos, percebemos a realidade de uma forma única, particular.
No entanto é imprescindível a mediação do outro para a tomada de consciência do eu – porque introduz a estranheza ou a familiaridade, a possibilidade de estabelecer relação, de suscitar comparação. Relação entre o corpo e o espírito. Relação entre o homem e o universo. Relação entre a ordem interna e a organização exterior. Relação directa com a matéria, um conteúdo que se conhece e se reconhece na variação e na semelhança com o contentor[5].
São as vivências, conhecimentos e demais condicionantes socioculturais que vão influir de maneira fundamental na elaboração da imagem por parte do observador. O observador ajusta e compõe os dados que a forma lhe oferece e fá-los coincidir com os esquemas que guarda na sua memória. Sistema de relações que permitem percepcionar o mundo na sua total abrangência, dos momentos anteriores, que passaram, aos posteriores, que continuam após aquele instante.
João Castro Silva
Professor Auxiliar Escultor
BIBLIOGRAFIA
- FORTES, Manuel de Azevedo, Lógica Racional, INCM, Lisboa, 2002.
- GOETHE, Johann Wolfgang, Escritos obre Arte, trad. de Marco Aurélio Werle, Imprensa Oficial, São Paulo, 2005.
- GORSZ, Elisabeth, 1995 Space, Time and Perversions: Essays on the Politics of the Body, Routledge, N.Y. & London, 1995.
- KNOBBE, Maria Margarida, A palavra da pele, Revista FAMECOS, nº 25, Porto Alegre, Dezembro 2004.
- SERRES, Michel, Variações sobre o Corpo, Bertrand Brasil, R. J., 2004.
[1] “(…) não precisamos inventar a roda porque ela sempre esteve em nós. Sua presença corporal dispensou-nos da necessidade de descobri-la.” (SERRES, 2004, p. 105).
[2] “(…) ainda que possamos perceber o espaço sem corpo, nunca poderemos perceber o corpo sem espaço.” (FORTES, 2002, p. 126).
[3] “Os corpos articulam discursos, sem necessariamente falarem, porque são codificados com e como signos. Articulam códigos sociais. Tornam-se intertextualizados, narrativizados; simultâneamente incarnam códigos sociais, leis, normas e ideais. “Se os corpos são atravessados e infiltrados por saberes, significações e poder, eles podem igualmente, em determinadas circunstâncias, tornar-se pólos de luta e resistência, inscrevendo-se activamente em práticas sociais.” (GORSZ, 1995, pp. 35/36).
[4] KNOBBE, 2004, p. 128.
[5] “Mas o que é o exterior de uma natureza orgânica senão a aparição que eternamente se modifica do interior? Essa exterioridade, essa superfície está adaptada de tal maneira a uma estrutura interior múltipla, enredada e suave, que ela se torna, desse modo, ela mesma algo de interior, na medida em que ambas as determinações, a exterior e a interior, estão sempre na mais imediata relação, tanto na mais silenciosa existência quanto no mais forte movimento.” (GOETHE, 2005, p. 159).
BIOGRAFIA de Miguel González Diez (Mikha-ez)