adriano de sousa lopes — conservação e restauro das obras académicas pertencentes ao espólio da faculdade de belas-artes da universidade de lisboa
26 ABRIL > 11 MAIO I GALERIA BELAS-ARTES
Inaugura no dia 26 de abril, na Galeria das Belas-Artes a exposição Adriano de Sousa Lopes — conservação e restauro das obras académicas pertencentes ao espólio da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, resultado do trabalho de restauro das pinturas de Adriano de Sousa Lopes, realizado pela doutoranda Liliana Cardeira, no âmbito do seu doutoramento, sob orientação da Professora Ana Bailão.
A curadoria da exposição é de Beatriz Bento, Mestre em Museologia e Museografia pela FBAUL.
A exposição é de entrada livre e estará patente até 11 de maio.
Horário:
2ª a 6ª 10h/18h
sáb.: 10h/13h
No dia 11 de maio a Galeria encerra às 13h00
Informamos que este evento é passível de ser registado e posteriormente divulgado nos meios de comunicação da instituição através de fotografia e vídeo.
DN (20.04.2018) — Belas Artes exibe obras restauradas inéditas de Adriano de Sousa Lopes
OBSERVADOR (26.04.2018) — Belas Artes de Lisboa exibem obras restauradas inéditas de Adriano de Sousa Lopes
SAPO24 (26.04.2018)— Belas Artes de Lisboa exibem obras restauradas inéditas de Adriano de Sousa Lopes
Adriano de Sousa Lopes nas Belas-Artes: vislumbres de uma carreira
What passing-bells for these who die as cattle?
— Only the monstrous anger of the guns.
(Wilfred Owen, Anthem for Doomed Youth, 1917)[1]
Adriano de Sousa Lopes (1879-1944) entrou nas Belas-Artes de Lisboa em 1895. Aqui foi aluno de Veloso Salgado (1864-1945) e de Luciano Feire (1864-1935). Prémio Anunciação em 1900, parte para Paris em 1903 com uma bolsa do Legado Valmor. Durante esta primeira estadia em Paris frequenta a École Nationale de Beaux-Arts e a então famosa Académie Julien; expõe no Salon d’Automne e, em 1907 e em 1908, viaja até Veneza – prelúdio das viagens que mais tarde fará pela Europa e pelo norte de África. Com a entrada de Portugal na I Guerra Mundial parte em 1917 para a frente de batalha, integrando o Corpo Expedicionário Português. Como oficial artista, o único entre as tropas portuguesas, regista o mortífero conflito militar e a penosa vida dos soldados-ratos nas trincheiras do norte de França. Desta experiência resultará um trabalho único na história da arte portuguesa.
O acervo Sousa Lopes da Faculdade de Belas-Artes integra onze pinturas que lhe estão atribuídas e que são datadas destes seus anos de formação: primeiro como aluno dos mestres lisboetas e depois como estudante bolseiro na capital da Europa, obrigado a enviar para Lisboa as provas do acertado investimento feito na sua educação cosmopolita. Este conjunto de obras é, assim, emblemático da natureza específica das coleções artísticas da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa (FBAUL): maioritariamente constituídas por obras do período de aprendizagem dos artistas e designers nacionais[2]. Esta restrição das coleções à breve e precoce passagem pela instituição dos autores das obras tem sido frequentemente entendida como uma fraqueza ou insignificância intrínseca – avaliação em que assentou muito do desinteresse a que estiveram votadas ao longo de décadas. Na verdade, deve ser entendida como sinónimo da singularidade e qualidade específica do património da maior e mais antiga escola nacional: ao abarcarem o período de formação dos artistas e designers nacionais, estas coleções permitem uma visão primordial das suas carreiras, através de criações que, tantas vezes, desaparecem ou ficam ocultas do olhar público e da investigação crítica; nalguns casos, permitem mesmo vislumbres inesperados ou antevisões renovadas do futuro já conhecido.
Sendo uma escola, a missão principal da FBAUL é «a formação, a investigação e a disseminação do saber nos domínios da arte, da cultura e da ciência que lhe são historicamente reconhecidos bem como nos domínios emergentes da criação contemporânea»[3]. Ao mesmo tempo, cabem-lhe responsabilidades museológicas embora, à semelhança de outras escolas de arte e design, nem sempre disponha dos recursos humanos e dos meios técnicos que melhor garantam a inventariação, a conservação e reabilitação do seu património material. Acima de tudo, a dotação financeira ao seu dispor esgota-se no cumprimento da sua missão principal, ficando até longe, como infelizmente sabemos, de suprir integralmente as necessidades inerentes. Esta dimensão dupla (ou híbrida) é um factor distintivo face a outras instituições de ensino superior e museus e, por isso mesmo, uma vantagem da qual deverá saber tirar partido – pese embora todas as dificuldades que, no contexto atual, coloca à sua gestão. Se a isto somarmos a manutenção e a preservação do Convento de São Francisco da Cidade, no qual a Faculdade está sediada, percebemos melhor a amplitude e o carácter sui generis dos desafios patrimoniais que a FBAUL enfrenta.
A criação de cursos e de vias de especialização (da graduação à pós-graduação) na área de ciências da arte e do património, a aposta que neles tem sido feita nos últimos anos e o claro crescimento tanto dos recursos como dos resultados diretamente ligados ao estudo, à preservação e à recuperação de obras de arte é um sinal claro da vontade da instituição em fazer das dificuldades vantagens. O investimento feito na preservação e na divulgação da grande coleção de escultura em gesso, de qualidade internacional, e a elaboração, em curso, de um plano estratégico para todas as coleções e acervos é um outro.
A presente exposição é, por isso, um excelente exemplo desta nova capacidade da FBAUL em estudar, recuperar e divulgar o seu próprio património artístico. Nela encontramos de forma muito clara estas três vertentes: ao tornar público o resultado do trabalho de restauro das pinturas de Adriano de Sousa Lopes, realizado pela estudante Liliana Cardeira, no âmbito do seu doutoramento, sob orientação da Professora Ana Bailão, a exposição permite difundir o conhecimento resultante do estudo das obras e do autor que a intervenção exige, revelando ao mesmo tempo o processo e os meios da própria intervenção. Esta ênfase no processo de trabalho, para além das inerentes razões científicas e óbvias vantagens pedagógicas, demonstra os paralelismos que a especialidade de conservação e restauro mantém com o processo produtivo de artistas e designers, a sua reconhecida importância nos resultados criativos e a repercussão que tem alcançado na cultura visual contemporânea.
Além das pinturas de Adriano de Sousa Lopes agora mostradas, a coleção das Belas-Artes integra ainda seis desenhos e vinte e quatro gravuras do artista. Destas, dez estão diretamente relacionadas com a sua experiência na frente de guerra e com o trabalho daí resultante. Uma sepultura portuguesa na terra de ninguém é, provavelmente, de todas as gravuras a mais próxima da crueza dos dois versos de Wilfred Owen nascidos da violência inaudita da Grande Guerra. Será dos escombros desta que nascerá o século XX. Mas será também depois dela que a carreira de Adriano de Sousa Lopes se tornará, em Portugal, uma das mais bem sucedidas da primeira metade do novo e moderno século.
[1] «Que sinos dobram para estes que morrem como gado? / — Apenas a fúria monstruosa das armas.» Os dois primeiros versos do poema de Wilfred Edward Salter Owen (1893-1918), poeta inglês que participou como soldado na I Guerra Mundial e morreu nas trincheiras francesas uma semana antes do armistício, surgem logo no início do War Requiem, composto por Benjamin Britten (1913-1976) em 1961-62 para a consagração da nova Catedral de Conventry (cujo edifício medieval foi destruído nos bombardeamentos da II Guerra Mundial). No texto da sua obra, Britten combinou nove poemas de Owen sobre a guerra com os textos latinos tradicionais da missa de requiem.
[2] A FBAUL é detentora de outras acervos, como os que integram obras adquiridas para fins assumidamente pedagógicos ou provenientes de legados. No primeiro caso, destaca-se a coleção de réplicas em gesso de grandes obras escultóricas mundiais; no segundo, o legado do professor e artista Lagoa Henriques (1923-2009). Relembre-se que o essencial das coleções artísticas reunidas na Academia de Belas-Artes de Lisboa, após a sua fundação em 1838, foram-lhe retiradas, entre o fim do século XIX e o início do século XX, para integrarem os novos museus públicos da capital – os atuais Museu Nacional de Arte Antiga e Museu Nacional de Arte Contemporânea.
[3] Estatutos da Faculdade de Belas-Artes, Diário da República, 2.ª série, N.º 43, 3 de março de 2014, p. 6227.