EXPOSIÇÃO FINALISTAS DE ESCULTURA FBAUL 13’14
7 > 30 MAIO I ANTIGO HOSPITAL DO DESTERRO
É com grande satisfação que, em nome da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, apresento mais uma exposição de finalistas do curso de Escultura. Desta vez, a exposição que reúne os estudantes que terminaram a sua licenciatura no ano letivo de 2013-2014.
Esta satisfação tem uma tripla razão: pela qualidade da formação ministrada e dos resultados alcançados; pela possibilidade dos novos artistas se apresentarem num espaço da cidade com a importância histórica, social e patrimonial do antigo Hospital do Desterro; e , finalmente, pela capacidade de uma arte tão antiga como a escultura continuar a reinventar-se perante os nossos olhos.
De facto, através do seu talento e criatividade, estes novos artistas tornam incontestavelmente contemporânea uma área de estudo, de investigação e de criação cuja existência académica recua à fundação da própria escola de belas artes em 1836.
Victor dos Reis (Presidente da FBAUL)
ESCULTURA NO DESTERRO
A Escultura no Desterro não deve ser confundida com o Desterrado[1] nem com o desterro da escultura. As obras que agora se exibem no Mosteiro de Santa Maria do Desterro, constituem, pelo contrário, um sinal de vitalidade da escultura, que aceitou o repto de sair do Convento de S. Francisco, no Chiado, (onde funciona a FBAUL) e de trabalhar, durante o último semestre de 2014, outro contexto de referência.
Volvido cerca de século e meio sob a modelação desse marco do naturalismo, ícone do êxodo português, a escultura passou, entretanto, por inúmeras transformações e prossegue hoje por caminhos bem diversos.
A prática contemporânea, já pouco tem a ver com a representação e mimese do primado clássico, ou com a praxis construtiva do modernismo, que exacerbava a autonomia do médium; a prática contemporânea, pós fluxus, tornou-se cada mais abrangente e miscigenada e reflecte um clima de indiferenciação de meios, materiais e técnicas; na crescente expansão de campo, a escultura hoje passou a integrar práticas tão diversas como a fotografia, o vídeo, a performance ou a instalação.
Para estes jovens artistas, recém-licenciados, a experiência de trabalharem junto à Mouraria, com tudo o que isso significa (nomeadamente, em termos de multiculturalidade) num espaço marcado pela arquitectura quinhentista, cistercense, mas que ao longo dos séculos se foi adaptando a outras funções[2], como bem o demonstram as profundas cicatrizes que apresenta, constituiu, simultaneamente, um desafio e uma oportunidade de aprendizagem.
O desafio teve, sobretudo, a ver com a possibilidade de se realizarem propostas de intervenção e/ou integração que estabelecessem conexões com o legado histórico arquitectónico e cultural do edifício.
A oportunidade de aprender, fora do contexto académico, resulta, mormente, da possibilidade de se sedimentarem noções que em abstracto são, por vezes, difíceis de entender. Além das questões formais (que têm a ver com o acerto da escala e da proporção, com a adequação das tecnologia aos materiais, com o enquadramento no espaço, com a percepção de complementaridade e/ou constaste da coabitação das obras instaladas, relações de equilíbrio e/ou instabilidade, etc.), o terreno da praxis confronta-nos com a necessidade de se conciliarem vontades e de se reunirem sinergias para se ultrapassarem diferendos idiossincráticos e se resolverem problemas logísticos que, só in loco, se deparam.
Olhando, retrospectivamente, para o projecto, agora concluído, imagino que os participantes se sintam gratificados pelo que aprenderam na interacção com the real thing e se sintam mais encorajados a intentar novos projectos.
Este já está![3]
Por muito desânimo e incredulidade que algumas vezes visse estampado em alguns rostos, reparo, agora, como se abrem em sorrisos de satisfação e isso é o bastante para esquecer as agruras do processo e continuar a acreditar que tudo é possível.
Recordam-se do início?
Das dúvidas e da descrença?
A satisfação de ver agora a exposição de ‘finalistas de 2103-2014’, in situ, constitui um motivo de satisfação acrescida, até porque se ultrapassaram, finalmente, os diversos constrangimentos, que inibiram a sua realização na data inicialmente prevista (Setembro / Outubro de 2014).
Afinal o que são uns meses comparados com os 500 anos do lugar (1500-2000) e o propósito devolver o mosteiro, com novas funcionalidades, à cidade de Lisboa, por mais quinhentos?
José S. Teixeira
19.IV.2015
[1] Escultura oitocentista de Soares dos Reis – O “ Desterrado” – mármore de Carrara, 178x68x73cm, (Porto, Museu Soares dos Reis / bronze e gesso, Lisboa, Museu do Chiado) Roma, 1872.
[2] Desde 1591, momento da construção, até ao terramoto de 1755 o edificado serviu de mosteiro aos frades bernardos da ordem de Cister. Entre 1789 a 1806 foi Hospital da Marinha; entre 1814 a 1834 pertenceu à casa Pia de Lisboa e serviu como colégio dos meninos órfãos; durante o mesmo período parte do edifício fez parte dos anexos hospitalares de S. José destinado a doenças infecto-contagiosas e venéreas. Entre 1895 e 1951 na sequência de uma empreitada de obras públicas o edifício foi adaptado a hospital agregado ao subgrupo ‘Capuchos – Desterro – Arroios’; No século XXI o Hospital foi desactivado e em 2007 foi adquirido pela Sagestamo; Em 2013 na sequência da parceria entre a Sagestamo a Mainside e a CML foi desencadeado um projecto de reabilitação para ocupação temporária do edifício.
[3] Graças, nomeadamente, ao especial empenho da Margarida Fragueiro que nunca desistiu de mobilizar os colegas, sacrificando inclusive, o tempo de se dedicar ao seu trabalho.
DESTERRO +500 – A revelação
Passados 500 anos de utilização como mosteiro e como hospital, revela-se agora um novo ciclo de +500 anos para o antigo Mosteiro de Nossa Senhora do Desterro.
Em 2014 iniciou-se a revelação do Mosteiro de Nossa Senhora do Desterro, começando a libertá-lo dos acrescentos sem interesse patrimonial que o aprisionavam. Uma boa parte da arquitetura original já voltou a ver a luz do dia, mas este trabalho não tem um final à vista. O respeito que o edifício exige fez com que a Arqueologia tenha sido incorporada na obra e, no futuro, será possível aos visitantes acompanharem de perto e até envolverem-se nos trabalhos arqueológicos. Uma faceta bem visível do peso que a cultura, em todas as suas dimensões, terá no Desterro.
Quanto ao conjunto de experiências pensadas para o edifício, baseiam-se sobretudo nas várias histórias que o Desterro viveu ao longo dos passados 500 anos. A hospedagem, contida no ADN do edifício, construído em 1591 para albergar os monges da Ordem de Cister que vinham a Lisboa, fará nascer um novo conceito de alojamento através de cápsulas habitáveis, instaladas nas naves dos antigos dormitórios do Mosteiro; das antigas hortas dos monges nasce o conceito de maternidade de plantas; o grande refeitório comunitário vai renascer, com o fogo como elemento central; a típica independência dos mosteiros inspira à criação do centro de produção, onde os ofícios antigos ressurgem adaptados aos dias de hoje.
Da filosofia de cura e bem-estar, decorrente das funções hospitalares a partir de 1856, surgiu a ideia de implementar projetos ligados às medicinas alternativas e naturais. Aqui se inserem conceitos como a biblioterapia, o uso de livros como remédios, ou as terapias expressivas através das artes.
O ensino e a investigação, presentes quer enquanto mosteiro quer enquanto hospital, inspira ao acolhimento de projetos em diferentes áreas da formação. Estas são algumas das ideias traçadas para o futuro do Desterro, que depois de ser mosteiro e hospital, se revela agora um centro experimental aberto ao Mundo.