Xapsim Conversa-dança-desenho
PERFORMANCE 29 MAIO I ASSOCIAÇÃO TODOS A GALOPE /// CONVERSAS À VOLTA DA MESA 31 MAIO I ZDB
“toda gente vive n’algum lugar. Nenhuma coisa é conectada a todas, tudo é conectado a algo.”
Donna Harraway
Gastão Frota com Coline Gras e a Égua Samba convidam para a performance Xapsim: conversa-dança-desenho, que trás ao público uma sessão de desenho direto conduzida pelo que um cavalo, a Samba, o Veludo, a Esmeralda … têm a nos dizer hoje. A performance é fruto da investigação de Gastão Frota pelo programa de Doutoramento em Arte Multimédia da Faculdade de Belas-Artes da Ulisboa em co-criação com a bailarina Coline Gras.
Resultante de dois anos de trabalho da dupla com os cavalos da Associação Todos a Galope, a performance Xapsim conversa-dança-desenho acontece na sede própria da Associação equestre no Parque Monsanto no sábado, 29 de maio de 2021, junto à abertura da exposição 12 Cavalos com Nomes (2021), de Gastão Frota, Professor do IARTE-UFU e bolseiro Quali-UFU (Brasil).
Mais informações e os ingressos para a Abertura podem ser consultados em https://zedosbois.org/programa/xapsim/.
Produzido em parceria com a Galeria Zé dos Bois, o evento conta também com uma mesa de conversas sobre o trabalho, na segunda-feira 31 de maio no ZDB, com a presença de António Sousa Dias (FBAUL/CIEBA), Joana Moreira (Presidente da TAG) e Verónica Policarpo (CLAN – Human Animal Studies), com entrada livre, sob reserva.
Sobre a trabalho e a investigação
Num canto do parque florestal lisboeta de Monsanto, rodeados por high-ways, aproximamo-nos por um jogo de achegos e esperas, na vibração de movimentos que se estendem das moscas ao músculo da pele, ao som de pássaros e comboios acompanhados por orelhas telescópicas e pupilas horizontais – para fazer dançar um desenho multiespécies.
O bigodudo Nietzsche dizia que o nariz é “o mais delicado instrumento à nossa disposição, uma vez que, com ele, pode-se constatar diferenças mínimas de movimento, que nem mesmo o espectroscópio registra”. Os cavalos o fascinavam talvez porque para além da capacidade de nos transportar, eles possuem grande capacidade de perceção somática dos movimentos (de atenção à subtileza das intenções de possíveis predadores) e um incrível faro para o presente relacional – e não é à toa que esses narigudos são símbolos da comunicação com espíritos para diversas etnias.
Motivado por um trabalho anterior com cavalos urbanos, as ciberAtrações charrete.net, Gastão Frota iniciou a investigação ciberAtrações e as veredas multiespécies no doutoramento da FBAUL, especulando usos de multimédia que pudessem amplificar o contacto humano-equino, pela colecta, partilha e manipulação de dados sensoriais em tempo real. Aproximar-se efectivamente de um equino entretanto é antes de tudo aproximar-se da sensibilidade dum espécime (e não somente de outra espécie) – que, como toda comunicação com o bicho, humano ou não, demanda-nos a escuta dum jogo de sensibilidades e surpresas.
Aprendi com Coline Gras, dançarina e cavaleira experiente, entre muitas coisas, que a coisa toda era mais simples (o que só a torna mais misteriosa). Aprendi por exemplo a não os mirar directamente nos olhos, só olho-no-olho – e hoje com eles converso desenhando da cintura pélvica à ponta dos dedos, corpo todo a actualizar um comum evolucionário e simanimagênico, de responsAbilidade e alegria na invenção de uma ecológica libertária – contra a bestialização, a indiferença, o colonialismo e os utilitarismos que reduzem as naturezas da relacionalidade viva e da linguagem à da poeira de estrelas, essa metáfora linda, mas ainda meio sem vida. (E que venha o dia em que possamos incorporar toda tecnologia à sensibilidade multiespécies nascente!)
Com o Pé à Terra da equitação ecologia e buscando ampliar espaços de carinho como o fazem na TAG e inventar novas maneiras de estarmos juntos, convidamos a todos a essa conversa-dança-desenho Xapsim, na certeza que “Quanto mais finos os sentidos, mais forte se torna a atenção para as diversas tarefas da vida” (Nietzsche). Afinal, como diz Viveiros de Castro e o paradigma dos multinaturalismos: “O Animismo é a única forma sensível do materialismo”
Gastão Frota
Quando entro no picadeiro as linhas já estão a fazer-se, com o cavalo a cavalar e Gastão a desenhar.
Geralmente o cavalo se deita no chão para se encher de poeira e vou apreendendo-o. Me pergunto quem ele é e quem sou eu com ele.
Ao estar em dança fico atenta a um possível apuramento das linhas, que aparecem em tal escala ou em tal amplitude. É possível também que eu saia dessas linhas. Desconfio que isso acontece quando elas perdem as suas próprias energias por qualquer razão.
É engraçado… pois o cavalo, muitas vezes, parece entender qualquer coisa e vem mais para perto do Gastão a desenhar, à frente ou um pouco em diagonal, e demora-mo-nos em sua maneira especial, ora mais dois a dois, ora mais a três… De longe, ter quatros ou duas patas não é a maior diferença para um corpo que cria ao lado-a-lado de com quem lá estiver. E aqui está
o cavalo!
Nota: No trabalho em curso não temos expectativas que o cavalo faça tal ou tal figura, como na equitação ou no desenho clássicos. A relação entre Coline e o cavalo aqui se apoia no “pie a terra”, método de ensino-aprendizado da linguagem do cavalo, e que torna possível um adestramento do cavalo a partir da vitalidade de ambos os pólos duma relação (que, entretanto, não é mais “suave”.) Como todo ser vivente, o cavalo é um ser extremamente misterioso, e parece que ele, ao longo de sua caminhada no mundo, tende a querer conversar-com-acompanhar o humano. É a partir então dos próprios corpos-afectos que nos compõem e se cruzam nas práticas que cada um a um vai exercitando, que inventamos essa conversa, na qual se vai ajustando a prática do Gastão no desenho, a criar, seguir, activar linhas cujo desenhar co-cria, claro, o espaço onde mexemos.
Coline Gras