faróis e tempestades
04 > 29 JANEIRO I GALERIA
Inaugura no dia 04 de janeiro, às 18h00, na Galeria das Belas-Artes a exposição “Faróis e Tempestades” de Ilídio Salteiro, com curadoria de João Paulo Queiroz.
A exposição estará patente até 29 de janeiro.
Este evento é passível de ser registado em vídeo e fotografia.
Mundus novus: algumas cartas para Ilídio Salteiro
Por João Paulo Queiroz
Eis uma viagem, a do primeiro homem, e a do último homem. As pinturas de Ilídio Salteiro são matéria tinta, matéria visão, matéria coisa. Apresentam-nos o nosso interior, parecendo que mostram a terra, as ilhas e os rios. Mostram-se coisas ora pequenas, ora grandes, ora dentro, ora fora: de ti, que espreitas, pendurado, para dentro destes rectângulos inventados por Giotto. É uma terra de bons selvagens, que se escondem nas torres, perdidos por faróis antigos, encantados pelos ventos de Miranda, de A Tempestade. Os selvagens destes novos mundos pintam-se com urucum e terra de siena, com azul prússia e terras da úmbria (Rousseau, 1959).
Daqui, talvez, o veterano marinheiro Americo Vespucio, que descreve a Lorenzo di Medici uma carta sobre a descoberta de mundos novos: “…. na frota a expensas deste Sereníssimo rei de Portugal, corremos e descobrimos, as quais terras nos deve ser permitido chamar Novo Mundo, … a maior parte dizem que, além da equinocial, para a banda do meio-dia, não existia terra continental, mas somente o mar Atlântico, e os que afirmaram haver ai terra negaram que fosse habitada de racionais. Mas o ser esta opinião falsa, e a verdade o contrário, se provou nesta minha última viagem…”.
Ora acompanhou sempre Américo Vespuccio um português, Rafael Hitlodeu, que depois de anos deixado à sua sorte, terá uma conversa com Tomás Moro. Uma vez publicada, mudará o mundo. Ilha de lugar nenhum, a primeira “Utopia”. Sítio de aberturas, pontos de vista para o exterior. Ou, de aberturas para um interior. Todo um território pensado, representado, cartografado. É um paraíso humano, lugar instável, área de passagem entre mundos, construções sem interior nem exterior, lugares para olhar como visões. De livros, de mapas, de terrenos, terras húmidas onde a natureza respira, onde a linha da maré agita os vivos, os que já foram, os que virão a ser.
Referências
Rousseau, Jean-Jacques, (1782), 2001. Rêveries du promeneur solitaire. Col. “Les Classiques de poche”. Paris: Livre de Poche.
Vespucio, Americo (1992) “Mundus Novus.” In Ribeiro, Darcy & Neto, Carlos. A fundação do Brasil: testemunhos 1500-1700. Petrópolis: Vozes, pp. 101-106.